"Seleções" : às vezes, mais do que mera curiosidade.

Luiz Pontual

Ao longo das décadas de trinta, quarenta e cinqüenta, a revista “Seleções do Reader’s Digest” alcançou grande sucesso e influência nas Américas, Europa e em vários outros países, entre eles Índia e Japão coloniais. Atualmente, não é nem sombra dos seus melhores dias.

Naqueles anos, tivemos o apogeu da imprensa diária, semanal e mensal; dos livros “populares”; do rádio e cinema... a televisão ainda engatinhava . Todos sabem que esta revista representava o ponto de vista do governo norte-americano em um período histórico decisivo para suas pretensões de hegemonia mundial, possível após a Segunda Grande Guerra (1939-1945), cujo ingresso foi forjado através de uma fraude chamada “Pearl Harbor”, algo equivamente ao “Incêndio do Reichstag” , à farsa do “11 de setembro” e às inexistentes “armas químicas do Iraque”.

A idéia dos De Witt, fundadores da “Seleções”, provou ser muito boa: tratava-se de condensar artigos jornalísticos “de interesse permanente”, contos e livros e apresentá-los mensalmente em um formato pequeno e prático. Ficaram famosos o notável apuro editorial, cuidados com o texto (estilo e revisão), vinhetas e ilustrações. Deste modo, ocuparam um espaço único entre os leitores, fazendo uma espécie de “ponte” entre o jornalismo diário – efêmero por natureza - e os livros, (caros e de menos fácil – ou digestiva - leitura...) cujo interesse freqüentemente atravessa décadas e mesmo séculos.

Esta vitoriosa visão editorial abrangia um amplo leque de artigos de caráter histórico e documental, filosóficos, científicos, políticos, culturais e de costumes de vários países e épocas, permitindo que se preservassem impressões, aspectos e retratos que dificilmente estariam ao nosso alcance de outra forma, pois se “atomizariam” na imprensa diária ou então seriam incorporados ou “congelados” em um plano muito mais geral e “enquadrados” no formato livro.

Entre a multidão de artigos que serpenteiam deste batalhas da Segunda Grande Guerra, Fords 46 com motores especiais para fugir à fiscalização durante a “Lei Seca” nos EUA, animais domésticos preferidos, biografia do inventor do motor elétrico e inúmeros “fait divers”, é possível localizar alguns artigos verdadeiramente originais e interessantes, seja pelo aspecto documental ou testemunhal, seja pela explicitação do modo presunçoso tipicamente norte-americano – ocidental moderno – de ver o mundo.

Ali estão, em “estado bruto” idéias e procedimentos estratégicos que vieram a se tornar o “americam way of life”, a ideologia que preza a superficialidade e o materialismo consumista acima de tudo e não deixa de ser interessante examinar o modo pelo qual acabaram por se impor, por bem ou por mal, a quase todo o mundo.

No entanto, há que se reconhecer em alguns artigos retratos e testemunhos divergentes à tendência majoritária da “Seleções” e são alguns destes, encontrados como trigo em meio ao joio, que publicamos aqui em nosso ‘site’ IRGET, não sem surpresa para muitos de nossos amigos e simpatizantes.

O desprezo e mesmo a ojeriza por este tipo de revista é algo muito curioso, infrutífero e até digno de nota; acaba sendo a transposição de certa mentalidade infantilmente “esquerdista” às perspectivas de fundo tradicional, que, evidentemente, nada têm em comum com a esquerda ou a direita. O próprio René Guénon, não deixava de ler e apreciar romances como os de Rudyard Kipling - um colonialista britânico impregnado dos mais enraizados preconceitos contra a Índia tradicional – em especial seu livro “Kim”, que proporciona informações únicas e interessantes sobre o “bas-fond” das articulações políticas e ideológicas dos britânicos na Índia ocupada.

Deixamos ao critério e ao repertório cultural de cada um encontrar nestes textos “sueltos” tão originais e inesperados o melhor proveito que possam fazer; alguns deles combinam de modo muito curioso dados tradicionais autênticos com preconceito e ausência de caráter do narrador, tal como aparece, por exemplo, em “A Ortopedia dos Curandeiros Selvagens”.

São desta famosa revista, por exemplo, “A Poderosa Madame Hsiung ” de Pearl S. Buck , “Aventura nos Mares do Sul”, “Meus hóspedes, os animais” e vários outros publicados aqui.