Um dos conceitos menos compreendidos no Ocidente moderno refere-se à doutrina hindu de castas. Tomando suas próprias referências socioeconômicas e transpondo-as mecânica e tendenciosamente, os ocidentais criticam violentamente o que julgam ser "o injusto sistema de castas", como se fosse uma discriminação entre classes sociais, tal como existe, por exemplo, nos EUA e na Europa.
Os critérios que classificam o indivíduo dentro de uma determinada casta, é bom reforçar, não são de ordem socioeconômica, mas, sim, estabelece-se uma hierarquia de importância, na qual os valores relativos à espiritualidade ocupam os lugares mais elevados. Desse modo, fazem parte das castas superiores aqueles que se identificam aos valores espirituais e participam das castas inferiores aqueles que se identificam aos valores materiais. Na verdade, dentro do hinduísmo, a casta significa para o indivíduo a sua própria natureza, isto é, significa viver conforme a sua mais profunda vocação. Na Índia tradicional (1) , a educação busca proporcionar os melhores meios para que as qualidades próprias de cada um possam ser desenvolvidas o mais completamente possível, desde tenra idade.
O termo hindu para este conceito é varna, que significa qualidade ou natureza própria de um ser. Ninguém duvida de que em uma mesma família há diferenças bem caracterizadas entre os filhos e que estas se manifestam muito cedo. Um deles demonstra, por exemplo, facilidade para canto e instrumentos musicais. Outro prefere afazeres mecânicos ou manuais. Outro ainda, por sua natureza introspectiva, inclina-se pela literatura. Essas diferenciações estão determinadas essencialmente e participam da constituição mesma de cada ser, constituindo o que se poderia denominar naturalmente "vocação" ou "chamamento".
A divisão das castas estabelece quatro níveis, os quais são, pela hierarquia, denominados: Brâmane, Kchatriya, Vaishya e Shudra. São Brâmanes os indivíduos cuja vocação os conduz irresistivelmente à vida espiritual; é sua atribuição a preservação e transmissão do conhecimento metafísico e da tradição, mediante o sacerdócio, dentro de um governo teocrático. Sua cor simbólica é o branco, que remete à pureza e à luz solar, em seu aspecto espiritual. Sua determinação é vertical, ascendente. A característica mental, concentrada. Sua realização, transcendente. O metal simbólico é o ouro, pois suas qualidades são permanentes: pureza e brilho que não se corrompem com o tempo. Identifica-se também à Idade de Ouro, à Essência, à. Luz Sapiente e ao sol, como símbolo do Princípio divino.
São Kchatriyas, aqueles que, por suas qualidades próprias estão capacitados às funções relacionadas ao governo dos homens e aos instrumentos de defesa deste governo. Os reis e os militares encontram-se nesta casta. Sua cor simbólica é o vermelho, relacionado ao calor e à expansão. A bandeira japonesa é uma representação Kchatriya por excelência, assim como os senhores feudais e os samurais. A determinação é expansiva, horizontal. Esta casta está subordinada naturalmente aos Brâmanes e é por este motivo que, por exemplo, na Idade Média, os reis eram sagrados pelo papa. A função real, afirma o taoísmo, é unir o céu e a terra, estabelecendo um governo de acordo com princípios espirituais. O Kchatriya reflete e ordena, tanto no sentido de organizar quanto no sentido de comandar. Identifica-se à Idade de Prata e às qualidades da lua, na medida em que esta reflete a luz divina do sol. Suas atividades dentro na ordem social assemelham-se ao dos monarcas e aristocratas.
São Vaishyas os que naturalmente se identificam com a função comercial e industrial (no sentido amplo do termo). São os provedores materiais. Os que trabalham nos campos plantando ou criando animais. Os que constroem casas e demais edificações particulares ou públicas. Todo tipo de artesanato e manufatura. E aqueles que comerciam alimentos, utensílios, moradas, enfim, tudo o que constitui o suporte material da vida humana; garantem sustentação material para que cada um possa cumprir sua função própria. Sua cor simbólica é o amarelo escuro ou marrom. Identifica-se à Idade de Bronze, que é seu metal simbólico (constituído de cobre, vermelho e estanho, cinzento). Liga-se ao mundo material, simbolizado pela terra.
São Shudras os que, por sua natureza, dedicam-se às mais variadas funções de mão-de-obra, semelhante aos operários. São os que aplicam principalmente a força física em suas ocupações profissionais. Identifica-se à Idade de Ferro cuja cor simbólica é o cinza escuro. A sua característica mental é marcada pelo apego à aparência, à emoção e à superficialidade. Envolvem-se com o trabalho no reino mais quantitativo e mecânico. Guarda semelhança , no mundo moderno, com os que se identificam ao socialismo e comunismo.
Deve-se assinalar a existência de uma subcasta, os Shandala, cuja característica é a ausência de qualquer qualificação. Cumpre a função de agentes da dissolução, desagregação, destruição. São forças cegas, corruptas e corruptoras, dissolutas, agindo em toda a parte e em vários níveis.
É importante registrar que, ainda que tenhamos estabelecido algumas comparações com as divisões sociais modernas, baseadas no poder financeiro, isso é feito por haver grande dificuldade em encontrar parâmetros entre a estrutura da sociedade moderna e a doutrina hindu de castas. No Oriente tradicional, um Shudra pode ser rico assim como um Brâmane pode ser pobre, materialmente falando, o que não modifica em nada o lugar que um e outro ocupa na sociedade e, conseqüentemente, a função que exerce.
É necessário destacar que a doutrina hindu de castas guarda perfeita analogia com todas as doutrinas autenticamente tradicionais. Trata-se da aplicação, no âmbito humano e social, dos princípios que regem a cosmologia. A divisão quaternária está presente na natureza: as Idades da humanidade, as estações do ano e as fases da lua, por exemplo. Até mesmo pela observação direta, podemos constatar que é perfeitamente natural que existam diferenças qualitativas entre os homens e que estas se ordenem hierarquicamente.
É admirável que a quimera igualitarista, exaltada pelos democratas e socialistas, tenha tantos defensores em nossos tempos atribulados e confusos: precisamente nos países ditos “socialistas”, como Cuba, a injustiça e a miséria – no sentido material e espiritual – atingem o máximo grau possível e imaginável, como demonstração trágica do ponto a que podem chegar tais fantasias (2).