Entrevista concedida por Luiz Pontual ao jornalista Pablo Villarrubia Mauso, publicada em 19 de agosto de 1990 no jornal Shopping News, de São Paulo .
"Fraudes, distorções ou até mesmo a falta de conhecimento rodeiam o pensamento milenar oriental. Para descobrir suas verdadeiras raízes, Luiz Pontual se fundamentou na obra do filósofo e orientalista René Guénon, considerado uma das maiores autoridades iniciáticas do século XX.
A final, qual é a verdadeira tradição oriental? Seitas, doutrinas, sociedades secretas e cursos intensivos professam as maravilhas do pensamento oriental desde o campo filosófico até o terapêutico. Mas resta saber se os mentores desses grupos são representantes legítimos destas tradições milenares. Com o intuito de responder a essa e a outras questões, surgiu há quatro anos o Instituto René Guenón de Estudos Tradicionais. O seu diretor, o orientalista Luiz Pontual, debruçou-se durante dez anos sobre obras praticamente inacessíveis ao grande público, especialmente do filósofo francês René Guenón, estudioso da história secreta da humanidade, ou seja, do que há por trás da história oficial. "Nenhum parecer individual tem valor entre as doutrinas e religiões. As tradições e suas verdades estão além de opiniões pessoais. Por isso existem garantias, normas e regras que garantem a ortodoxia dessas tradições", explica o orientalista. Segundo ele, são poucas as pessoas no Brasil que conhecem as fontes "limpas" e autenticamente orientais do pensamento metafísico.
"As doutrinas orientais não são proselitistas, ou seja, não exigem a persuasão para que as pessoas adotem religiões como o budismo, hinduísmo ou taoísmo", esclarece Luiz Pontual. Mas como saber com segurança o que é e quem é verdadeiramente oriental? "Com certeza não são aqueles indianos que estão na Califórnia", contesta Pontual. "Não é a fonte que vai à pessoa que tem sede, é o contrário. As verdadeiras autoridades sempre pertencem à linhagem espiritual, que remonta à tradição primordial, e não procuram fazer propaganda de seus conhecimentos." Outros fatores que determinariam o verdadeiro pensamento oriental são a estabilidade e equilíbrio interior e a superioridade concedida aos valores suprapessoais.
René Guénon (1886-1951), ainda pouco conhecido no Brasil - é tido na Europa e no Oriente como o melhor intérprete das doutrinas tradicionais do século XX. Formou-se junto a representantes genuínos do hinduísmo, islamismo e taoísmo, deixando mais de 20 livros sobre um conhecimento ignorado pelo Ocidente durante centenas de anos. Conhecedor de várias línguas, como o sânscrito e o tibetano, teve acesso às fontes originais de leitura e mosteiros de vários países. O hindu Ramana Maharshi afirmou Guenón como The Great Sufi ("O Grande Sufi"): um título concedido a pouquíssimos ocidentais.
No livro "Le Theosophisme, Histoire d'une Pseudo-Religion" (inédito no Brasil), Guenón tenta provar, através de várias fontes e pesquisas, a origem caótica do teosofismo, surgido em 1875 nos EUA. Sua fundadora, a russa Helena Blawatsky, teria sido condenada na Índia, no Egito e nos EUA por professar falsos poderes e conhecimentos sobrenaturais. Em 1884, a Sociedade de Pesquisas Psíquicas de Londres verificou "in loco" que os fenômenos supostamente mediúnicos da Sociedade Teosófica da Inglaterra eram também fraudulentos.
"Muitas das seitas e pseudo-religiões existentes hoje em dia são filiações diretas ou indiretas do teosofismo, que inicialmente foi apoiado pelo próprio governo britânico para mudar a posição religiosa dos hindus e firmar o colonialismo, porém sem sucesso", revela Luiz Pontual. No Ocidente, o teosofismo teria vingado com uma suposta ideologia evolucionista, reencarnacionista e progressista. Vários conceitos científicas foram transpostos como religião no teosofismo, embutindo uma mentalidade moderna dentro de uma roupagem aparentemente oriental. Ele acrescenta que, através de várias fontes, Guenón demonstrou que a teosofia foi inspirada em inclinações misteriosas de pessoas pertencentes a organizações contra-iniciáticas de ordem satânica, com o objetivo de influenciar a psique coletiva.
Outra corrente esotérica contra-iniciática era aquela liderada por Gurdjieff (1877-1949). "Ele era satanista autoproclamado até mesmo no título de sua obra principal 'Relatos de Belzebu', defendendo a contradição e a ilógica", diz Pontual. Fontes fidedignas apontariam Gurdjieff como alcoólatra (mantinha seu escritório dentro de um bar), hipnotizador e usando seus poderes para fins escusos. Já o mago e guru inglês Aliester Crowley, líder de uma seita satânica, influenciou muitos movimentos alternativos de todo o planeta, especialmente os hippies. Entre os seus discípulos diretos mais conhecidos no Brasil estão o escritor Paulo Coelho e o falecido roqueiro Raul Seixas.
Outra distorção apontada por Luiz Pontual é que mais de 90% das obras sobre orientalismo publicadas no Brasil são mal traduzidas. Exemplo disso é a palavra reencarnação, que não existe em sânscrito ou em chinês e é usada freqüentemente. "O que se reconhece é a transmigração, ou seja, é a passagem do ser humano por outros estados que não o físico. Por isso a palavra reencarnação é inadequada, pois revela a transposição da alma para algo material", define o orientalista.
Mas as críticas não param por aí. Segundo Pontual, muitas das escolas e cursos que se destinam ao trabalho corporal não estão de acordo com a tradição e são regidos pela improvisação e falta de preparo real. Em conseqüência, muitas pessoas acabam se decepcionando com os dogmas quando não encontram respostas claras, lógicas e que satisfaçam intelectualmente. "As doutrinas orientais não possuem dogmas. Estes são exclusivos das religiões hebraica e cristã", define Pontual.
O Instituto René Guenón de Estudos Tradicionais estará realizando no próximo dia 27 um curso intensivo de um mês sobre "O que é oriental de verdade". "As pessoas poderão descobrir com enorme satisfação que as doutrinas orientais estão vivas e seus verdadeiros representantes, disponíveis”.